viernes, 6 de mayo de 2016

Lisboa sob a Pele (I)

Era a segunda vez que visitava a minha querida cidade, que o foi desde
o momento em que voando cheguei a ela. Agora eram o mar e o rio, os
que de novo me faziam cair no seu encanto. E eu deixei-me conquistar
de novo. O Grand Mistral entrou pela manhã muito cedo pelo estuário do
Tejo, e não podiamos deixar passar as sopresas que nos ia oferecendo.


Poucas coisas marcaram tanto as minhas viagens como a entrada em duas
grandes cidades por mar. Uma é Veneza a outra Lisboa.
Quem como eu, tenha a sorte de entrar na capital lusa num cruzeiro,
terá ante si, como numa tela de cinema, séculos de história de
conquistas, riquezas, homens de valor e de fé, decadência e saudade,
amores e odios. Todos eles feitos em pedra, cimento ou argamassa,
ferro, vidro o cerâmica, esperando pacientemente que ponhamos os pés
em terra para receber-nos tão bem como só um português o sabe fazer,
com o coração aberto.




No inicio, só podemos distinguir ao amanhecer a silueta da ponte 25 de
Abril entre as brumas, ou brilhando com a luz do novo dia.
Depois, atentos á margem esquerda, onde se encontra Lisboa, começa o
desfile de prodigios: a sem par Torre de Belém, filigrana em pedra e
esperança de navegantes que chegavam de além mar, ou a ultima imagem
dos que partiam; o Padrão dos Descobrimentos, homenagem aos grandes
descubridores que armados somente com a sua fé cristã, o seu valor e
ousadia, deram a Portugal terras infinitas e infinitos subditos à sua
Coroa; à sua frente, terra dentro, o Mosteiro dos Jerónim, lugar de
recolhimento de reis e rainhas, descanso de glorias nacionais como
vasco da Gama, Luis de Camões ou Fernando Pessoa.




Do outro lado já nos vai recebendo entre os seus braços o Cristo Rei,
de 25 metros de altura, que vigia e protege Lisboa desde o alto de uma
colina, quem sabe para evitar que volte a ficar destruida como em 1755
depois do terremoto de escala 9, que quase pulverisou a cidade e que
foi seguido de um tsunami com ondas entre os 6 e os 20 metros de
altura; passamos milagrosamente por debaixo da ponte 25 de Abril, obra
de engenharia com quase 2 kilómetros de comprimento, 70 de luz e com
uns pilares que chegam aos 190 metros sobre o nível da água.


E repentinamente encontramo-nos no centro de Lisboa. Na margem do rio
aparece, frente ao barco o Terreiro do Paço e a Praça do Comércio, uma
das mais elegantes do mundo; por cima dela, o Castelo de São Jorge, a
Catedral ou Sé, São Vicente de Fora e o Panteão Nacional, que acolhe
os restos dos homens ilustres.


O Cais de Santa Apolónia recebe-nos com deligência, como
apressando-nos para que conheçamos a sua cidade, a minha cidade, Lisboa.

No lado sul da geométrica e monumental Praça do Comércio, temos o
Terreiro do Paço que albergou o palácio real durante 400 anos,
enfrente ao “pai” Tejo, e descendo por umas escadas de mármore com
pilares, temos o Cais das Colunas lambendo o rio.
Aqui atracavam naquele tempo as caravelas e galeões que descarregavam
especiarias, sedas, ouro, madeiras finas e frutas, tudo vindo das
colónias, e a praça fervilhava de marinheiros, piratas e mercadores.






Um rio de cruzados afluia então a Lisboa, e para conta-los mais
rapidamente colocavam-se mil moedas num cofre ou caixa que os continha
na medida certa, daí vem a expressão portuguesa Caixa, que quer dizer
mil escudos.




Hoje, quem chega ao Tejo , vem em barcos de transporte públicos, em
barcos de recreio ou em cruzeiros, como no meu caso, em vez de
caravelas e galeões.


Há varias opiniões sobre o melhor momento para visitar o cais das
Colunas. Uns dizem que é melhor ao amanhecer, otros ao meio dia e
outros ao ocaso.




Viu-o das três maneiras, mas sem duvida prefiro o amanhecer, quando a
contraluz dá ás colunas uma magia surpreendente e pinta a ouro a
Praça, seguramente a última imagem que guardavam na memória os
marinheiros daquele tempo.




A melhor maneira de desfrutar e conhecer Lisboa é viver as suas ruas,
cheira-las, senti-las, mete-las sob a pele.








Em Alfama as ruas cheiram a sardinhas, a rebocos húmidos, a musgo, a
vinho, a lojas antigas como as que ainda e segundo a tradição
portuguesa conservamos em Canárias. Mas sobretudo, cheira a Saudade,
essa melancolia que deixaram impregnada nas suas paredes todos os que
partiram até ás longinquas terras e ao olharem para trás a viram
afastar-se.


















Rossio é o coração de Lisboa, o seu centro nevrálgico, com as suas
lojas de artesanato e recordações, os seus cafés históricos, bancadas
de flores e pombos. Lugar de encontros de gentes que povoavam as
antigas colónias portuguesas da Guiné, Angola, Cabo Verde e Moçambique.

A Baixa, favorita de Pessoa, é o centro comercial e financeiro, o
monumento reconstruido na íntegra pelo Marquês de Pombal, depois do
terramoto de 1755. Ele ofereceu a Lisboa ruas revestidas de azulejos,
sedes de boutiques de alta moda, lojas de musica e grandes livrarias
internacionais. A Classe de Lisboa respira-se aqui...




Graça é o bairro dos obreiros, das escadas sinuosas e dos miradores
que deixam de boca aberta os visitantes, é o bairro da Feira da Ladra,
mercado que desde 1872 tem lugar por detrás da imponente igreja de São
Vicente de Fora.













Para descansarmos um pouco da nossa caminhada por Lisboa, nada melhor
que acercarmo-nos a este ponto indispensável em qualquer caminhada
pela preciosa cidade, refiro-me a Santa Luzia. Maravilhoso
observatório, que em vários níveis mistura frescos jardins com
frondosos emparreirados de buganvílias, com varandas e bancos de
azulejos polícromados que se abrem perante o horizonte do Tejo.

Quando a vista se acustuma a tanta beleza, destinguimos entre as
ruelas e as casas, que parecem aguentar em pé à custa de promessas, a
cúpula de Santa Engrácia e o encanto de Alfama, o brilho do rio e a
margem que parece chamar-nos sem cesar.






Se nos virarmos, a igreja de Santa Luzia chama-nos também, mas para
ensinar-nos outra paisagem. Paisagem essa que reflete em paineis de
mosaicos a Praça do Comércio antes do terramoto de 1755 e também a
expulsão dos árabes da cidade.
Construida sob a protecção dos Cavaleiros de Malta, mantem-se como um
dos edíficios mais simples e evocadores de Lisboa.
















São Vicente de Fora, que quer dizer exactamente fora das muralhas, e
assim terá sido naquele tempo, uma vez que se construi-o fora dos
limites da cidade, é um edíficio renascentista que por vezes, e visto
ao longe, mais parece uma fortaleza que um convento, deverá estar
dentro de qualquer rota numa visita mesmo que breve a Lisboa.








Esta faustosa igreja é fruto de uma promessa que o Rei D. Afonso
Henriques fez a São Vicente, a troco de que os mouros fossem expulsos
de Portugal. Supõe-se que os ossos do Santo estejam guardado ali.
Dentro, podemos ver e desfrutar do mármore branco do teto, da
incrustação do altar da N.S. da Conceição com os azulejos brancos e
azuis que ilustram as fabulas de La Fontaine, do gigantesco órgão e do
lindissímo baldaquino, que conferem ao templo um caracter de museu de
arte sacro e profano, único na capital portuguesa.








Na antiga sacristia, habilitada naquele momento como Panteão Real,
descansam os restos mortais dos membros da casa real de Bragança, com
excepção de um rei e uma rainha, a saber, D. Maria e D. Pedro IV.










Uma curiosidade: quando sairmos do edíficio, passemos pela rua que
existe à sua esquerda, a Rua do Arco Grande de Cima, e observemos
varias curiosidades na parede da igreja e na parede oposta...








Mais a baixo o Panteão.






Todos os visitantes, ou a grande maioria, chegam ao Panteão com a
ideia de que este seja um lugar de enterramento dos ossos e cinzas dos
grandes e ilustres homens portugueses, como o seu homónimo em Paris, e
não vão muito enganados. O que pouca gente sabe, é que, a fabulosa
Igreja de Santa Engrácia, e a sua dilatada história arquitectónica
começa na época longinqua do século XVII e a sua conclusão só ocorreu
em 1966, tendo pelo meio o terramoto de Lisboa.




O resultado foi uma mistura barroca com toques de modernidades diversas trasidas pelos
arquitectos e engenheiros que iam formando o relevo da construção.
Vasco da Gama, Camões, Afonso de Albuquerque e Henrique o Navegante,
grandes ecos do passado português, ou o Presidente Carmona e os
escritores Almeida Garrett e Guerra Junqueiro mais recentes, mas não
menos importantes, repousam no sono eterno dos justos no monumento.
Impoõe-se a altura da cúpula e o silencio que se respira, assim que
passamos a porta do recinto.


Sejam dados honra e respeito aos homens Notaveis do País!

Pelas empinadas ruelas de Alfama quase não circulam carros, por isso é
mais divertido apanhar o eléctrico, o famoso 28, que chilrreando a
trepa por aquelas empinadas e torturosas ruas do bairro até chegar ao
Castelo de São Jorge.










Mas descamos caminhando até à Sé e entremos, sem pressa, na preciosa
Catedral, o templo mais antigo da cidade. Claro que, como em quase
toda a península, este se edificou sobre uma mesquita, depois da
reconquista de Lisboa e foi restaurada depois dos terramotos de 1344 e
1755.












Claro que, e como deve ser numa catedral romanica, o seu
interior é escuro, no entanto os toques de luz das vidraças, das
fracas luzes e velas, ressaltam a beleza da nudez das paredes e das
obras policrómadas e outras peças de arte que a decoram, ilustrando as
diferentes épocas e estilos da história nacional.








Sarcofagos, estátuas, brazões de pedra de soberanos e cavaleiros da
corte, o túmulo da Princesa desconhecida, um presépio barroco de
madeira, cortiça e terracota, uma maravilhosa fonte batismal, onde
segundo se diz, foi batizado Santo António, ou o tesouro da Sé que
guarda as ricas vestimentas eclesiásticas e os vários objectos de
ouros católicos.






















Reservemos um pouco do nosso tempo para sentarmo-nos na nave central e
ademirar o que nos rodeia ou rezar segundo a nossa crença ou
conveniencia...












São muitos séculos que nos observam, quase dez.

Chiado, renascido, qual ave Fénix das cinzas do incêndio que destruio
metade do seu corpo em 1988. Aristocático e elegante, culto e
intelectual, escritor e poeta como sus acólitos Ribeiro ou Pessoa.

O Bairro Alto das mil caras, alegre, africano, bohémio, de seculenta
cozinha ou meca do fado, que não sabe se ficar no passado ou
aventurar-se no futuro.

Existem mais bairros, existem mais ruas, existe mais Lisboa, mas não
vou desvelar os seus segredos. Lisboa, haverá que vive-la e
senti-la sob a pele.

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